domingo, 27 de abril de 2014

[1º encontro dos Diálogos de Competitividade debateu o tema Desempenho e Complexidade Econômica]

Por Ivan Bicudo, da ABDI

O que o Brasil pode fazer para elevar seu patamar econômico e tornar sua economia mais sofisticada? Essas foram duas das questões motivadoras do debate no primeiro encontro da série Diálogos de Competitividade, realizado no IEA-USP no dia 24 de abril.
foto: Sandra Codo
A série é uma iniciativa da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) em parceria com o Movimento Brasil Competitivo (MBC), o Grupo de Pesquisa Observatório da Inovação e Competitividade/NAP (OIC) do IEA-USP e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A ideia é discutir a trajetória e o estado atual da economia brasileira em comparação com a de outros países e refletir sobre quais são os elementos para uma agenda de competitividade nacional. 
O primeiro encontro dos Diálogos de Competitividade teve como principais participantes Jorge Gerdau Johannpeter, presidente do Conselho de Administração da Gerdau e membro do Conselho Superior do MBC, Fernanda de Negri, diretora do Ipea, Mariano Laplane, presidente do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), Aod Cunha, líder para o setor público do JP Morgan Brasil, Esther Dweck, chefe da Assessoria de Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, e David Kupfer, assessor da Presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).O tema proposto no primeiro debate, Desempenho e Complexidade Econômica, que passa por questões macroeconômicas, de caráter amplo, teve início com as apresentações dos moderadores Mário Salerno, coordenador do OIC, e Roberto Alvarez, gerente de Análise e Projetos Estratégicos da ABDI. Alvarez fez uma breve análise dos indicadores econômicos do Brasil em questões como PIB, exportações, importações e participação no comércio mundial. Esses dados foram compilados a partir de uma aplicação web denominada Decodificador de Competitividade. O ferramenta já funciona em fase piloto e reúne 164 indicadores, de 65 países diferentes, referentes a uma série de 12 anos.

Infraestrutura e investimentos
foto: Sandra Codo
Um dos temas de destaque no debate foi a infraestrutura no Brasil e como financiar seu desenvolvimento. Fernanda de Negri apontou que nos últimos anos o país apresentou uma cultura de menor sofisticação de sua economia e até mesmo de crescente especialização. Ela identificou que a defasagem da infraestrutura, pressionada pelo crescimento da economia, é um gargalo para a competitividade no cenário mundial. 
David Kupfer argumentou que o déficit em investimento no Brasil em relação ao PIB nos últimos 35 anos é muito alto. Segundo ele, um dos desafios é criar instrumentos que permitam que o capital flua das áreas em que ele é excedente para áreas em que é escasso. “A política fiscal tem uma função vital na criação de instrumentos de financiamento do desenvolvimento”, disse. 
Para Esther Dweck, existe também o desafio de atrair investidores de longo prazo para atingir os setores que precisam de financiamento: “Investimento em infraestrutura tem maior risco associado e longo prazo. Precisamos mobilizar capitais privados para suprir a necessidade de financiamento em infraestrutura.” 
Já Aod Cunha acredita ser necessário aumentar o tamanho da poupança em relação ao PIB. “Precisamos gerar mais capital. O volume de crédito gerado pelo País em relação ao tamanho dos investimentos necessários é bastante escasso.” Segundo ele, a defasagem de competitividade brasileira é muito bem diagnosticada, porém, falta desenvolver o diálogo no sentido de criar uma agenda de políticas com o objetivo de contornar os problemas.

Desigualdade e qualidade de vida
Países com economias avançadas e com alto índice de crescimento, como Estados Unidos e China, tiveram um grande aumento da desigualdade social, um aspecto importante da competitividade sistêmica, comentou Mariano Laplane. Ele identifica a possibilidade de o Brasil aumentar a competitividade melhorando a igualdade de acesso a serviços públicos: “A desigualdade tem custos e devemos concentrar nosso esforço para reduzir essas desigualdades”. Como exemplo, citou a segurança e a mobilidade urbana, serviços que em maior quantidade, qualidade e distribuição territorial propiciam ganhos evidentes de bem-estar e expansão de mercados, mobilizando a sociedade e criando aspirações mais altas, segundo Laplane.

Educação e logística 
Durante o debate, a importância da educação e da qualificação de mão-de-obra para a competitividade foi um consenso entre os participantes. “Com educação, conseguiremos facilmente patamares internacionais de produtividade de mão-de-obra”, disse Jorge Gerdau Johannpeter. Ele também ressaltou a importância da logística nos setores produtivos, do primário à manufatura, e criticou o alto peso dos impostos sobre as empresas, o que chamou de “cumulatividade de impostos”. “O aço mais barato do mundo é o brasileiro, e é também o mais caro”, disse o empresário referindo-se à diferença entre o custo de produção e o valor dos impostos. “Não quero privilégios, mas preciso de isonomia competitiva.”

Próximos encontros
Na segunda-feira, 28 de abril, no sala de eventos do IEA, será realizado o segundo encontro da série, com formato similar e transmissão ao vivo pela web. O tema desta vez será Infraestrutura e Capital. Os Diálogos de Competitividade prosseguem no dia 6 de maio, com o tema Talento e Inovação, e terminam no dia 8 de maio, com o tema Qualidade de vida e Crescimento Futuro.

sábado, 26 de abril de 2014

[O novo modelo ferroviário (II)]

No último artigo, destaquei alguns aspectos do modal ferroviário brasileiro e mencionei pontos que mostram as justificativas que levam à necessidade da revisão do funcionamento do mesmo. Foi também mencionada a importância das ferrovias como variável para a competitividade brasileira.

Cabe aqui uma referência à matéria da revista Exame desta quinzena, onde são aprofundados pontos e comparações que vão ao encontro do que foi explorado no artigo anterior. Isto confirma que o tema está na agenda do dia.

Iniciado na década de 90, o processo de concessões no setor de ferrovias seguiu o modelo chamado Vertical. Este modelo tem a característica de conceder a iniciativa privada tanto à construção e manutenção das vias, como também a operação do chamado material rodante (locomotivas e vagões). Resumindo e simplificando, a concessão dava ao concessionário a obrigação e os direitos de construir e manter as vias, além da operação exclusiva das cargas.

Este modelo, Vertical, teve seu papel e foi responsável pelos avanços destacados no artigo anterior; no entanto, acabou gerando algumas dificuldades, por exemplo: a concentração no litoral das vias, monopólio da infraestrutura e dos serviços, ausência de competição intramodal devido à concentração em determinados setores e exclusividade das cargas entre outros pontos.

O grande desafio de um novo modelo é impulsionar o transporte ferroviário a partir da expansão da malha e universalização do uso.

O novo modelo proposto quebra em duas partes o processo de exploração. Ele se torna um modelo horizontal e não mais vertical, como usado anteriormente. Você terá dois tipos de agentes, a saber: o concessionário da infraestrutura (comercialização do uso da infraestrutura), onde o concessionário é responsável pela construção e manutenção das vias; e os operadores de carga (comercialização do transporte).

Este modelo parte da premissa da separação entre o responsável pelas vias (que disponibiliza os espaços de transporte na sua estrutura); dos operadores (que movimentam a carga na via). Há um grande objetivo neste modelo: o de criar condições para que tenhamos vários operadores de cargas e passageiros.
Podemos fazer a analogia com o modal rodoviário, onde você tem a concessionária da exploração e manutenção das vias (rodovias) e as operadoras que exploram o transporte (por exemplo, as empresas de ônibus). Na teoria é um modelo interessante, gera estímulos e condições para o aumento da concorrência de transporte de cargas, visto que o concessionário de infraestrutura terá interesse de disponibilizar seus espaços de transporte ao máximo de clientes possíveis (operadores de cargas). Por outro lado, este modelo exige uma regulação complexa.

O agente público neste formato (horizontal) tem um papel importante: o de regular a alocação de capacidade de transporte (disponibilizada pelos concessionários das vias), para os operadores de cargas, levando em consideração as necessidades econômicas do país e também evitando a monopolização da capacidade disponível. Isto é conhecido internacionalmente como Open Access. O país mais avançado nesse sistema é a Alemanha onde éutilizado na operação interna ao país e na operação interna à Europa.

Ainda há um grande caminho para efetiva implantação do modelo. Alguns passos já foram dados; o modelo já foi formalmente instituído e a estrutura governamental está sendo adaptada para ele. No entanto, a prova de fogo virá com os leilões dos trecho ferroviários e com o efetivo comportamento do mercado.

terça-feira, 8 de abril de 2014

[O novo modelo ferroviário (I)]


O custo da logística no Brasil está ao redor de 15% do PIB. Nos países mais desenvolvidos este percentual corresponde a  8% do PIB. Basicamente, isto significa que, entre o produtor e o embarque em um dos portos do país, temos uma diferença de competitividade, ou melhor, uma perda, ao redor de 100 bilhões de reais ao ano.

No momento em que passamos por uma necessidade de mudança de modelo de desenvolvimento, a importância de investimentos em logística é fundamental para podermos fazer frente às necessidades do país e conseguirmos uma taxa de crescimento sustentável. Neste ponto, gostaria de fazer uma breve reflexão sobre o tema ferroviário.

Indiscutivelmente, para avançarmos na melhoria do nosso custo de logística é fundamental a diversificação dos modais de transportes que temos. Principalmente no que se refere à carga. O modelo ferroviário é sempre lembrado a partir de exemplos dos países desenvolvidos. Claro que temos a possibilidade das hidrovias, mas esse tema fica para uma próxima oportunidade!

Analisando o nosso modelo ferroviário, verificamos que a partir do processo implantado na década de noventa, avançamos razoavelmente bem. Por exemplo, de 1997 a 2011 tivemos um crescimento de 1.154 a 3.014 no número de locomotivas (161%); de 43.800 a 99.500 em número de vagões (127%); de 137.000 para 292.000 unidade de toneladas transportadas (112%) e um aumento de 47% de participação na matriz de transportes. Saímos de uma participação das ferrovias de 17% para 25% no total, o que ainda é pouco em comparação com países com uma logística desenvolvida.No entanto, o potencial ainda é muito grande e há um bom espaço para crescimento.

Se analisarmos alguns indicadores verificamos isto. Por exemplo, atualmente temos 28.000 Km de malha ferroviária, onde apenas 3.000 Km estão em pleno uso; ou seja, temos 25.000 Km de potencial de uso subutilizado. Além disto, o compartilhamento de vias é muito baixo, ao redor de 9%.
Outro ponto a ser destacado é a característica do transporte - a grande concentração do transporte ferroviário no país, quase que 100%, é realizada em distâncias abaixo de 1.000 Km. quando em outros países 90% da utilização de ferrovias se dá em distâncias superiores a 2.000 Km.

Essa situação se deve a uma série de fatores tais como: incapacidade e falta de estímulo a expansão; ausência de competitividade intramodal; poucos atores na operação da infraestrutura e dos serviços e concentração dos serviços em curtas distâncias (pólos de desenvolvimento concentrados). O conjunto de fatores faz com que o transporte ferroviário não seja uma opção de larga escala, concentrando-se em setores específicos (mineração, combustíveis e grãos).

Portanto, uma nova forma de exploração ferroviária é necessária para o país. O modelo que se pretende adotar, denominado genericamente como Open Access, parece que atende a essa necessidade. No entanto, a explicação de como este modelo funciona e suas premissas serão pauta dos próximos artigos.