segunda-feira, 31 de março de 2014

[ O custo da burocracia no imóvel ]

A burocracia e seus efeitos é algo que constantemente está na pauta. No entanto, são poucas as vezes em que isto é quantificado, permitindo termos a real dimensão dos impactos gerados em nossa vida.

Há uma premissa básica na área da gestão que diz: “quem não mede não gerencia!”;  ou seja, o primeiro passo para termos a efetiva dimensão de determinado problema é um diagnóstico detalhado, com dados e indicadores mensuráveis, medindo e quantificando o tema em questão. Somente com isto poderemos definir ações claras para propor soluções.

Nesse sentido, a CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), a ABRAINC (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias) e o MBC (Movimento Brasil Competitivo) se propuseram a realizar e que deu origem ao estudo que leva o nome do título deste artigo.

Este estudo, que teve como parceiro técnico a Booz&Co, apresenta, por meio de exemplos reais, sugestões para trazer maior eficiência ao processo, bem como cases de sucesso nacionais e internacionais, além de apresentar boas práticas no País.

O estudo constata que o excesso de burocracia para a construção e aquisição da casa própria aumenta em até 12% o valor para o proprietário. Este custo onera toda a cadeia do setor. Trazendo em termos de valor atual, isto equivale a R$ 18 bilhões por ano.

A burocracia também aumenta o prazo de entrega. Por exemplo, um imóvel financiado pelo FGTS que, em geral, leva cinco anos para sair do papel (do projeto à entrega), dois anos são consumidos pelos processos burocráticos.

Os problemas não são novidade para quem atua no setor, são conhecidos e envolvem temas como aprovação dos projetos, falta de padronização dos cartórios, falta de clareza nas avaliações das licenças ambientais e mudanças na legislação, como alterações nos planos diretores e de zoneamento.

No entanto, o estudo inova em explicitar os problemas através de indicadores, medições e comparações com melhores práticas, além de analisar isto em todas as etapas da cadeia para vários tipos de empreendimento.

Em cada etapa da cadeia, foram priorizados os principais gargalos. Por exemplo na etapa Terreno, foram analisados os impactos de temas como zoneamento, concessionárias de água e esgoto e concessionárias de energia. Na etapa “Durante a Obra/Construção” foram identificados problemas nos temas mão de obra e subempreita e assim por diante.

Para não ficar somente na identificação dos problemas, o estudo propõem soluções, através de uma análise comparativa com práticas que já são adotadas em outros países e cidades, inclusive brasileiras, que tem avançado no processo de agilização e desburocratização. Adotar melhores práticas, já existentes, poderia além de reduzir custos, diminuir o prazo médio de entrega de 60 mesas para 32 meses.

Não há nenhum segredo mágico nas soluções identificadas, basicamente é gestão, transparência e diálogo. Importante destacar que a maioria das soluções são escopo do poder público, mas também há várias alternativas que passam pela necessidade do setor privado em melhorar sua eficiência e competitividade.

As dificuldades estão dos dois lados do balcão e quem está pagando a conta é a sociedade como um todo!

A versão sumarizada do estudo pode ser localizada nos sites das instituições que realizaram o trabalho.



domingo, 23 de março de 2014

[ O Papel das Agências Reguladoras ]

Nesta terça-feira, 25, participo do painel “A Melhoria da Gestão nas Agências Reguladoras”, que compõe as atividades comemorativas aos 15 anos da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).Neste debate participarão representantes da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), Ministério do Planejamento e da própria ANVISA. Portanto, pretendo compartilhar aspectos relevantes deste tema que explorarei no evento.

As agências reguladoras foram criadas na década de 90, início de 2000, com o objetivo de fiscalizar a prestação de serviços públicos praticados pela iniciativa privada.Elas surgem a partir do processo de privatização que ocorreu à época, para instrumentalizar o Estado na fiscalização e controle de qualidade da prestação de serviços, estabelecendo regras para os setores regulados.

Na esteira deste movimento, destaco as 10 principais agências: Águas (ANA), Aviação Civil (ANAC), Telecomunicações (ANATEL), Cinema (ANCINE), Energia Elétrica (ANEEL), Petroleo (ANP), Saúde Suplementar (ANS), Transportes Aquaviários (ANTAQ), Transportes Terrestres (ANTT) e a própria ANVISA.

Em 2003, foi criada uma comissão interministerial que analisou e avaliou o papel das agências, na perspectiva dos novos desafios colocados, a época, para a economia brasileira.
A partir desta análise e com base em experiências internacionais ficou evidente que a regulação, através de mecanismos centrais, é uma forma contemporânea de ação do Estado. Tal regulação pode ser econômica, social ou administrativa. O que a realidade demostra, atualmente, é a atuação das agências como uma combinação destes três vetores.

De um lado, as agências devem propiciar a estrutura institucional para os agentes econômicos (empresas e mercados), com o propósito de facilitar, limitar ou intensificar os fluxos e trocas de mercados; além de  garantir os princípios de confiabilidade e regras de entrada e saída do mercado. Outra função das agências é o controle na provisão dos bens públicos e na proteção do interesse público a partir da definição de níveis de qualidade de serviços, segurança e acesso.

Por fim, a regulação administrativa refere-se a intervenção nos procedimentos administrativos e burocráticos, adotados pelo Poder Público em sua relação com os setores administrados.
Portanto, já é possível perceber a importância das Agências como órgãos de Estado e a necessidade de que sejam instâncias profissionais e modernas, pois elas têm um poder enorme de intervenção nas relações sociais e de mercado.

Neste sentido, a preocupação com a eficiência em gestão é fundamental para as agências com o intuito de ter a velocidade e a segurança nas decisões tomadas.

Por exemplo, na dimensão econômica, o objetivo é a busca constante da maximização da eficiência em mercados caracterizados pela concentração de poder econômico e naqueles onde as barreiras à entrada são significativas. Neste ponto destaco o papel das Agências de Telecomunicações e a própria ANVISA na área de medicamentos.

O aspecto de regulação econômica surgiu há mais de um século nos países desenvolvidos, devido à concentração industrial observada naquela época.

Em qualquer que seja a motivação para a regulação, a experiência tem mostrado que há três elementos basilares para o bom desempenho institucional das agências: harmonia entre as instituições regulatórias e os ambientes político, administrativo, social e econômico; independência operacional e transparência (sujeição à prestação de contas).

Aqui vale abrir um parêntesis- seguidamente verificamos nas notícias políticas sobre o conflito entre executivo e legislativo nas nomeações para as agências. O processo de busca de aprovação no Senado aos nomes dos dirigentes das agências é um ponto positivo, desde que não se torne moeda de troca política. Hoje no Brasil temos situações em que Agências estão sem dirigentes nomeados devido a este conflito entre poderes e a ingerência nas indicações, onde o aspecto competência profissional tem ficado em segundo plano.

Vou dar um exemplo da necessidade de profissionalização das Agências. Atualmente um dos maiores problemas do país é a logística. Estamos num processo crescente de concessões de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos, que é fundamental para ganharmos velocidade no enfrentamento deste gargalo de competitividade. Todo os processo de modelagens destas concessões é papel das respectivas agências (ANTT, ANTAQ e ANAC). Essa atividade engloba toda a relação publica e privada que será necessária, jurídica e econômica. Quando falamos em concessões, estamos falando em processos de 20, 30 ou até 50 anos, onde a regulação econômica e social deverá ser consistente e transparente para garantir os bons serviços públicos dentro de um equilíbrio econômico para os investidores. Portanto, termos agências profissionais e eficientes é fundamental para o sucesso dos programas de concessões.

Um ponto fundamental para o bom funcionamento da regulação e das agências regulatórias refere-se à importância das área e seus atores se reconhecerem como sistema. Por exemplo, A ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) é a responsável pela regulação no processo de logística citado anteriormente. Além da ANTT, na área de ferrovias e rodovias temos outros atores: DNIT (Dpto Nacional de Infraestrutura em Transportes), VALEC (empresa estatal responsável pelas ferrovias), EPL (Empresa de Planejamento e Logística em Transportes) e o Ministério dos Transportes. É fundamental a coordenação entre estes entes para o melhor resultado. No entanto, o que temos verificado é a necessidade, ainda, de um longo caminho a percorrer.

As partes seguem operando independentemente, as próprias agências definem os termos pelos quais entendam que devam ser supervisionadas e os ministérios responsáveis não conseguem interagir adequadamente com as autarquias, estatais e agências.
Isto pode ser verificado no exemplo dos transportes, mas também na saúde (ministério da saúde, ANVISA e ANS), na aviação civil etc.

No caso do painel que participarei, a preocupação com estes temas no que diz respeito a Anvisa é fundamental. Esta agência supervisiona, regula, fiscaliza e autoriza produtos e serviços em áreas e setores que representam 27% do produto interno bruto do país. Trazendo em números, a Anvisa regula um universo de R$ 1,5 trilhão entre medicamentos, insumos, alimentos, produtos de saúde, equipamentos, cosméticos, serviços etc.

Neste exemplo fica evidente o impacto que uma agência pode ter tanto no aspecto econômico (fiscalização de plantas industriais, por exemplo) quanto no aspecto social (autorização de entrada de um novo medicamento no mercado ou a retirada deste). Portanto, o fortalecimento das agências deve sempre tratar deste binômio econômico e social, que é um equilíbrio tênue, porém, fundamental para o desenvolvimento do país.
Por fim, gostaria de agradecer às contribuições que recebi a partir do artigo “Do Big Mac ao IPhone”, pretendo responder a todos. Um abraço e até a próxima semana!

Dúvidas, opiniões e sugestões podem ser feitas através do email clgastal@gmail.com

[ Do Big Mac ao IPhone ]

Um ponto que sempre me inquietou no meu cotidiano profissional foi a necessidade, nem sempre com êxito, de buscar exemplos, explicações e textos que tornassem mais palatáveis questões, muitas vezes áridas, sobre gestão, competitividade e produtividade. A capacidade de transformar assuntos de certa complexidade em uma narrativa simples e de fácil compreensão é uma caminhada que exige, a meu ver, muita dedicação e domínio dos temas que se pretende abordar. É esta intenção - a de fazer esta caminhada. 

Pretendo, com esta série de artigos que serão publicados neste espaço, aprender, compartilhando com o leitor o conhecimento, as inquietações e as dúvidas que estão presentes na atuação cotidiana e profissional. Portanto, caro leitor, faço este convite, a enfrentar comigo o desafio de transformar temas relativamente complexos em algo que possa ser compreendido de maneira cotidiana, sem a necessidade de lançar mão de conhecimento técnico especializado. 

Hoje, temas como competitividade sistêmica, produtividade, inovação, gestão, marcos regulatórios, entre outros, são encarados como algo de especialistas e são muitas vezes considerados temas que não dizem respeito ao dia a dia do cidadão. Ledo engano! Num país como o Brasil, onde 40% do PIB (produto interno bruto) é de responsabilidade do setor público e os outros 60% estão no setor privado, o impacto das decisões referentes ao universo da área pública, como reformas, marcos regulatórios, decisões macro e micro econômicas, reestruturações gerenciais, afetam diretamente o cotidiano de cada um de nós. Portanto, compreender como estas decisões acontecem, como elas são desdobradas, como afetam o ambiente de negócios, como afetam o dia a dia de Estados, municípios e, por fim, do cidadão, é não só importante, como também fundamental para construímos um maior capital social! 

Neste sentido, o que pretendo, escrevendo neste espaço, é auxiliar (um pouquinho que seja) na construção do conhecimento necessário para uma reflexão autônoma de cada leitor. Aprendi, desde cedo, que a melhor forma de desenvolver o conhecimento é compartilhar o conhecimento! Este deve ser o objetivo de cada um que está preocupado com o futuro. Então vamos lá! 

O título deste artigo, pode soar estranho ou mesmo, para os mais céticos, uma apologia ao consumo. Não é este o objetivo! As duas marcas, ou os dois produtos citados, têm o objetivo de auxiliar-nos na reflexão de um tema que constantemente está na pauta -  o chamado Custo Brasil. Nada melhor para compreender um tema, do que usar exemplos e realidades que estão presentes no nosso dia a dia. Mesmo sabendo que alguns leitores poderão reagir, questionando que os dois produtos em questão, estão longe de ser algo massificado, aceito o risco de utilizá-los como exemplos. 

Outro ponto que pretendo lançar mão para auxiliar nesta análise é o processo de comparação. Ou, como chamamos na gestão, Benchmarking! Isto nada mais é do que o processo de comparar determinado resultado, desempenho ou, neste caso, preço, com outros atores, empresas e aqui neste texto, com outros países. 

A revista The Economist da última quinzena traz uma matéria muito interessante que trata da análise e comparação dos preço para aquisição de um IPhone, entre alguns países da América Latina. Esta mesma revista, realiza desde o ano de 1986 uma análise dos preços do Big Mac entre 48 países. Em ambos os casos ela faz a homogeneização dos dados através da chamada paridade do poder de compra (PPP). Que é a técnica utilizada que permita você comparar preços/valores, minimizando as diferenças de câmbio, pib, renda etc. Nestes dois casos, do Big Mac como do IPhone, é fácil constatar que alguma coisa não está andando bem com o nosso País. 

Quando analisamos o exemplo do IPhone, verificamos que o preço deste produto no Brasil é o mais alto, a um valor pesquisado de U$ 1.080, enquanto na Argentina, Chile, Colômbia, México, Peru e Venezuela, os valores são respectivamente U$ 710, U$ 842, U$ 750, U$ 798, U$ 1,039 e U$ 775. Importante destacar que tanto na Argentina como na Venezuela o valor utilizou como referência um valor de câmbio paralelo, devido a pouca confiabilidade dos dados oficiais. No caso do chamado índice Big Mac, a última análise realizada em janeiro de 2014 mostrou que o valor no Brasil, equalizado pela PPP, está abaixo apenas de 4 países, a saber: Noruega, Venezuela, Suécia e Suíça. O preço no Brasil gira ao redor de U$5, enquanto na Rússia, China, México e Austrália os valores são respectivamente U$2.6, U$2.7, U$2.78 e U$4.4. O que podemos concluir com estas duas comparações? Na minha opinião mostra que estamos com uma disfunção no nosso País. 

Nossa economia é bem maior que vários países utilizados na comparação, as nossas instituições estão mais consolidadas também, e por fim, tivemos um aumento de poder de compra, pela inclusão de mais pessoas no mercado de consumo. O que há então? Basicamente é aquilo que cansamos de verificar em manchetes de jornais e revistas! O Brasil ainda não encaminhou as reformas necessárias para podermos sairmos desta disfunção. O ambiente de fazer negócios no Brasil é caro e complexo; o custo da mão de obra (aqui é o valor total, salários encargos etc);  não o custo final do valor que o colaborador leva para casa, que continua baixo. Por exemplo, no Brasil o empregado leva para casa 40% ao redor do custo total, enquanto em países como o Chile este valor chega a 80%.A produtividade e, principalmente, o manancial tributário que estamos inseridos são outros exemplos. Na questão tributária, somente o custo de transação, que não é o custo efetivo dos impostos, mas o custo de realizar os procedimentos de recolhimento, pagamento, registros etc, chega ao redor de 10% a 12% do PIB. Na logística temos um custo de 15% do PIB enquanto nos Estados Unidos é de 8%. Essas e outras tantas somas de não competitividade é o que geram as diferenças de valores citados nas comparações. 

Avançamos muito nos últimos anos com estabilidade econômica, inclusão social, investimentos em infraestrutura, porém temos uma grande caminhada pela frente. Não há alternativa, temos que continuar a pressionar, cobrar, exigir e principalmente nos mantermos informados em busca da visão crítica dos impactos que as ações geram no nosso dia a dia. Concluindo, é para esta caminhada e para este objetivo que lhe convido. Portanto, da próxima vez que você for saborear um “Xis Tudo com Tudo” ou seu filho ou filha lhe pedir um celular de última geração, lembre-se que você estará pagando um valor mais alto que deveria, devido às nossas próprias barreiras. Barreiras, temas e assuntos que pretendo compartilhar e debater neste espaço.  


Dúvidas, opiniões e sugestões podem ser feitas através do email clgastal@gmail.com